domingo, 7 de junho de 2009

6/7/2009
Idosos: vítimas indefesas da violência
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), até 2025, o Brasil será o sexto país do mundo com o maior número de pessoas idosas. Mas, em muitos casos, esse aumento da população com mais de 60 anos não está acompanhado de uma melhor qualidade de vida para a terceira idade. Na proporção em que eleva o número de idosos, crescem também os casos de agressão a essa parte da população, não só física, mas também social. Nesta reportagem, veja como está sendo feito o combate a essa violência e o que fazer para evitá-la.
Roberta Meireles

Íris*, de idade não informada, descobriu que sua irmã, Elba*, de 86 anos, está sendo agredida por outra irmã de ambas, mais jovem. “Eu a encontrei com uma torção no pé e ninguém a havia levado para o hospital. Ela disse apenas que tinha caído”, narrou. Em uma segunda visita, Íris encontrou Elba chorando. Na última vez que foi ver a parente, viu arranhões em seu ombro. “Perguntei: ‘estão lhe batendo?’. Ela confessou que sim, disse que era nossa irmã e perguntou se eu também ia bater nela”, contou Íris. Casos como esse, de violência contra os idosos, estão cada vez mais comuns na sociedade. Apenas este ano, foram registradas 416 ocorrências na Delegacia do Idoso do Estado. “As mais comuns são de maus-tratos físicos e psicológicos, como ameaças, perturbações e humilhações”, apontou o delegado Eronildo Farias.
Irmã Silvânia, assistente social do grupo da terceira idade Nossa Senhora da Glória, que conta com 180 idosos, sabe que muitos são agredidos, mas não dizem nada. “A gente sabe que existe a violência, mas, por medo, eles escondem”, falou. João*, de 86 anos, foi empurrado por um vizinho e não ficou calado. Depois de ir ao Hospital da Restauração (HR) e levar alguns pontos na cabeça, ele prestou queixa na Delegacia do Idoso. “Não podia deixar passar”, afirmou. De acordo com a assistente social da Promotoria do Idoso do Ministério Público, Tânia Brito, ele é uma exceção, já que os idosos dificilmente denunciam quando sofrem violência. “Eles omitem por receio, já que, na maioria das vezes, o agressor é alguém próximo”, explicou.
Ainda de acordo com a promotora, às vezes quem denuncia é outra pessoa, que não aguenta presenciar a violência. Segundo a promotora de Cidadania do Ministério Público, Yélena Araújo, apenas 30% dos casos são notificados. “Antes só questionava a violência contra a mulher, contra as crianças. Agora é que se começou a falar na pessoa idosa”, argumentou. Segundo Tânia Brito, os problemas podem começar até mesmo antes da terceira idade. “Às vezes, os mais velhos já são negligenciados a partir dos 50 e poucos anos. Não denunciam e essa situação se estende para a velhice”, disse.
Esse silêncio pode ter consequências trágicas. “Em janeiro, uma senhora do nosso grupo cometeu suicidou com chumbinho (agrotóxico), por não aguentar as agressões psicológicas que sofria”, revelou irmã Silvânia. Mas não é só a família que tem que prestar queixa, qualquer um que saiba da ocorrência pode fazê-la. “Estamos trabalhando junto aos grupos de idosos e aos profissionais de saúde para conscientizá-los e, se souberem de algum caso, denunciarem”, disse a conselheira do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa do Recife (Comdir), Selma Castro.
De acordo com o delegado Eronildo Farias, a pena para esse tipo de violência é de dois meses a um ano de detenção. Caso seja de natureza grave e tenham causado lesões corporais graves, a sentença pode ser de um a quatro anos de reclusão. Para a conselheira do Comdir, a lei é muito branda e precisa mudar. “Nosso Código Penal precisa passar por uma reforma. A impunidade acaba contribuindo para a não-denúncia dos casos”, opinou Selma.

* Os nomes foram trocados para preservar a identidade dos entrevistados

6/7/2009
63% dos agredidos são mulheres


De acordo com uma pesquisa realizada, em 2006, pela assistente social Marlene Pereira na Universidade Federal de Pernambuco, dos 140 atendimentos realizados na Promotoria do Idoso naquele ano, 63% demonstravam violência contra mulheres acima dos 60 anos. “Elas confiam mais cegamente nos filhos”, argumentou a advogada voluntária da Federação das Associações dos Idosos de Pernambuco (Faipe), Aldenira Lins.
Idosos de 75 a 90 anos constituíram 46% das vítimas de violência, segundo o estudo. “Quanto mais incapacitado, maior a chance de ser vítima de agressão”, explicou o agente da Delegacia do Idoso, Maurício Gomes. Na sequência, vêm as pessoas entre 60 e 74 anos, com 24% dos casos de agressão; e dos acima de 90 anos, com 9% (21% dos registros não tiveram a idade identificada na denúncia).
Quanto à relação do agressor com a vítima, 50% das queixas são contra filhos e/ou netos. “Percebo que a maior parte dos agressores são os filhos homens”, disse Aldenira Lins. Os demais familiares representam 14% das denúncias de agressão; 17%, outras pessoas; 8% contra companheiro; e, em 11% dos casos, o agressor não foi identificado. A renda dos denunciantes também foi classificada pela pesquisa: 44% recebiam um salário mínimo.
De acordo com o titular da Delegado do Idoso, Eronildo Farias, os casos de pessoas com renda mais baixa são em maior número porque os com renda mais alta relutam para denunciar. Mas o fato de não denunciar não quer dizer que os mais ricos não sejam agredidos. “Quem ganha mais, sofre um pouco menos. Idoso sem dinheiro é abandonado”, expôs o agente Maurício Gomes.

Serviço
Faipe
Rua Riachuelo, 105, Boa Vista, Recife. Fone: (81) 3221-8507

6/7/2009
Conselho do Idoso é realidade para poucos
Apenas 40 das 184 cidades do Estado contam com órgão para garantir direitos
Roberta Meireles

Atualmente, apenas 40 dos 184 municípios pernambucanos contam com o Conselho do Idoso, órgão responsável por acompanhar a elaboração e execução de políticas públicas voltadas à garantia dos direitos da população acima dos 60 anos. Para mudar esse contexto, os direitos da pessoa idosa estão no centro do projeto Caravana da Cidadania, que o Ministério Público de Pernambuco iniciou na último dia 20, em Gravatá, Agreste do Estado. O projeto tem o objetivo de fomentar a implantação e fortalecimento dos conselhos dos idosos. De acordo com a promotora de Cidadania do Ministério Público, Yélena Araújo, a caravana percorrerá mais nove municípios ainda este semestre, abrangendo todas as regiões do Estado. “No segundo semestre, vamos voltar a todos esses locais para rediscutir o que já foi feito e o que precisa ser ajustado. É essencial ter esse feedback (retorno)”, completou a promotora.
Outra instituição que cuida dos direitos dos mais velhos no Estado é o Centro Integrado de Atenção e Prevenção à Violência contra a Pessoa Idosa (Ciapi). Com quase um ano de funcionamento, o centro oferece atendimento técnico de profissionais como advogado, assistente social e psicólogo. “Queremos que quando o idoso chegue aqui, ele encontre as respostas que procura”, afirmou a coordenadora do Ciapi, Paula Machado. Ela informou que o Centro atende a aproximadamente 70 pessoas por mês.
Os serviços são voltados para orientação, encaminhamento e mediação de conflitos. O atendimento também contempla famílias, associações, cuidadores domiciliares e institucionais, conselheiros de idosos de saúde e direitos humanos. O projeto, da Secretaria de Desenvolvimento Social (SDS), é uma parceria do Estado com o Governo Federal e foi criado para acabar com o alto índice de violência praticada contra os idosos em Pernambuco.

PROGRAMAÇÃO
Pensando no Dia Mundial de Combate à Violência Contra o Idoso, que é comemorado em 15 de junho, o Ciapi preparou uma programação especial. Na próxima terça-feira, no auditório da Celpe, na avenida João de Barros, Recife, haverá durante a tarde atrações culturais e palestras sobre o tema “Gerações em Paz”, abordando as relações familiares e a violência contra as pessoas com mais de 60 anos. Já no dia 15, a Secretaria de Direitos Humanos e Segurança Cidadã da Prefeitura do Recife realizará atividades na Estação Central do Metrô. Serão distribuídas fitinhas roxas - símbolo da campanha - e haverá apresentações culturais e uma feira de serviços, que oferecerá aferição de pressão arterial e limpeza de pele, além de informações sobre saúde e direitos dos idosos. No Aeroporto Internacional do Recife/Guararapes-Gilberto Freyre, também serão distribuídas as fitinhas e terão atrações de dança. No dia 16, a distribuição continua no aeroporto. Leia também

6/7/2009
Violência também pode ser social

Segundo a conselheira do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa do Recife (Comdir), Selma Castro, ainda existe uma violência social contra o idoso. “Os mais jovens fazem chacota quando ele passa na frente em filas, mesmo ele tendo prioridade. As famílias constróem as calçadas de forma irregular - que gera ondulações e pode provocar quedas -, e os motoristas de ônibus não param no meio-fio, o que atrapalha, já que, em geral, os idosos têm problemas de locomoção”, apontou.
Ainda segundo Selma, esse tipo de violência “está disseminada em vários setores: bancos, repartições públicas”. “Falta respeito”, concluiu. Selma, que é idosa (tem 72 anos), revelou que, no trânsito, ser mais velha é sempre um problema. “Uma das situações em que o idoso é mais agredido é quando ele dirige. Se as pessoas se colocassem no lugar do outro, isso não aconteceria”, sentenciou a conselheira.
A promotora Yélena Araújo alertou também que uma da violências sociais mais silenciosas, mas que mais podem machucar os mais velhos é o isolamento. “Em muitos casos, o idoso convive apenas com a pessoa que cuida dele. Ele não tem contato com amigos, vizinhos, não participa de grupos, não vai à igreja”, detalhou. O titular da Delegacia do Idoso, Eronildo Farias, lembrou, ainda, que falta compreensão das pessoas com aqueles que têm mais de 60 anos.
“Todos nós vamos envelhecer. Ninguém envelhece porque quer, é o processo natural da vida. Às vezes as pessoas não entendem isso”, pontuou. “A questão do idoso é uma questão de todos nós: família, sociedade, poder público. Cabe a este último dar condições de vida às pessoas, e criar políticas publicas para isso. E as famílias não podem deixar o idoso sofrer; têm que se engajar e fazer sua parte”, concluiu o delegado.

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